quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

E quando as palavras secam?
Dry Neres




Os olhos ficam feito mar em ressaca. Fica uma bagunça o ato de olhar. Não sei enxergar o sol que se apresentou pra mim nessa manhã de pássaros e flores azuis. Os potes que se escondem minhas tintas de fazer palavras, secaram. Porque minha alma foi inundada por um sentimento de turvidez, fora do alcance da minha compreensão tão infante. Os altos morros uivantes me visitaram em forma de chuva nas horas passadas que se foram tão longas. Me deixaram teu perfume adormecido nos olhos, na boca, nos seios. Me a-dormeceram os dentes na tentativa de ranger. Como lobo desalmado quisera arrancar o órgão que bate descompassado, cansado, abstrato que fica aqui no extremo esquerdo deste corpo tão pequeno, tão pesado. Precisava roubar todas as nuvens dos céus, dos mundos pra repousar este corpo de criatura tão sentimental. Precisaria habitar as asas de todos os seres que o dom têm de voar, pra me sentir sem algemas, com par. Minhas pernas cansadas, com estas roupas justas que parecem ousar a tentativa de comprimir esses sentimentos que sinto assim, calada. Eu queria ser. Mas não sei se sou. Não sei se existo, tenho, moro, vivo. Já não sei. Pareço arrastar-me como réptil infame, e frio, e gelado nos becos das sombras que gritam gemendo na estaticidade. Queria ir embora dessa cidade, talvez do planeta. Quem sabe Marte...? Quem o sabe o mar. Quero me livrar desta doença que sou eu. Dos cabelos espalmados, do jeito de me preocupar com o mundo dos outros, sem me preocupar com o meu local de estar. Das mãos que se estendem facilmente com mil folhas escritas à almas que não sabem sentir o sentimento que sinto, assim tão vermelho-dor. Morro de várias mortes e como cacto sinto meu peito amargo. E quando as palavras secam... Lágrimas largas inundam meu cobertor. E numa mistura tão cibernética, sim, porque pareço estar no pólo extremo norte do meu sentir tão dolorido, percebo que esbarraram no Ctrl Z, e foi-se tudo o que um dia pedi que não fosse tão rápido. Esperei que demorasse mais. Não tive tempo sequer de escrever um livro sobre nossa inquietude tão calma, tão doce, tão eu que já não sou sem você.

9 comentários:

Katia De Carli disse...

Minha linda
"Tão eu..." sim, por que não? Só que diferente, mudada, remendada, passada a limpo...
Dói? Sim! E vai doer por muito tempo. Vai doer pelo que foi e pelo que não teve tempo de ser.
Vai doer pelo realizado e pelo que ficou ma esfera do vir a ser.
Vai doer...
Mas um dia, será lembrança. E das boas! Porque ninguém vive um amor assim e permanece igual.
A gente muda. Pra melhor.
Pra amar melhor e outra vez e mais uma vez e sofrer se for preciso e seguir amando... assimé a vida.
Você pode escolher se fechar para o amor e nunca mais sofrer. Mas garanto-lhe, é uma escolha covarde e não é digna de você.
Chore todas as lágrimas salgadas e quando não as tiver mais, chore aquelas secas, que ficam escondidas na alma...
Um dia você acorda (literalmente) e constata que não existem mais lágrimas, daí está pronta!
Te amo

Eli disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Eli disse...

O que seria de um poeta, se este não fosse purificado e lapidado pelo sofrimento?

Anderson Meireles disse...

Ao morrer de várias mortes é que percebemos que podemos renascer de várias vidas. E para pintar uma vida nova você já tem pincel e tinta,
Abraço!

Anônimo disse...

Minha querida.

Algumas tintas devem secar para que novos matizes possam brotar da Natureza interior, aos nosso olhos. Algumas telas só ficam prontas depois de aplicadas várias camadas de cores e texturas, secas, molhadas, mas no final, um todo, um belo todo.

Assim, a felicidade. Vc é uma artista d´alma. Saberá lapidar bem as texturas fluídicas para compor um quadro perfeito de paz, amor e tranqüilidade.

Beijos fraternos de quem te adora de verdade.

Ana

Poeta Mauro Rocha disse...

Ola!! Que texto!! Feliz 2009.

Heduardo Kiesse disse...

"Precisaria habitar as asas de todos os seres que o dom têm de voar, pra me sentir sem algemas"

gosto sempre de realçar as passagens que mais me entram pela alma e esta é apenas uma delas pois em todo o poema encontrei estrelinhas dignas de realce minha poetiza de eleição!

senti o teu sentir!!!!


teu beijo,m dentro de ti!

Heduardo Kiesse disse...

não páres nunca de escrever pra que me possas inspirar!!

:-)

Andreia disse...

É a saudade! *