terça-feira, 5 de maio de 2009

Carta do homem moderno a Deus
Dry Neres



Por que nos afastamos assim? Não sei reconhecer mais tua voz, e desconheço o calor que emana das suas mãos. Não sei mais sentir falta, nem dos nossos risos dispersos. Tenho a língua inundada de questionamentos acerca da tal fé. Onde se perdeu nossa cumplicidade? O mundo frio está. Congelou-se! Os corações amargos são... As mãos que afago eram pra dar, distribuem a morte, aflição. Sinto que seu abraço se perdeu do meu e minha face escondeu-se de sua face serena. Sou tão pequena Pai... Sou tão insana e profana e artista e humana. Sou mais carne que espírito. Sou mais sangue que água e sou assim igual aos tantos outros. O mundo envaideceu-se e o amor acabou se perdendo. O corpo nosso desintegra-se e somos muitos, somos vários, todavia não unos em amor. O que o Senhor acha de tudo isso? Ligo o rádio do carro a fim de acalmar o espírito, e tenho tentativa frustrada, pois só escuto tiro, gripe, desemprego. Leio o jornal a fim de encontrar aumento algum pro Insuficiente (chamado de Mínimo) e recebo enchentes, aquecimento, furto.

Meus olhos desacreditam das bibli(a)-ografias que tentam definir o que é a fé. Enclausuram a figura de um Deus-carrasco, um Deus-chicote, que na verdade só é Deus-Pai, Deus-Amor. Não tenho mais vontade, sede, saudade... Até que motivos tenho muitos... Mas perco-me na falta de coragem. Lembro-me do tempo que meus olhos sabiam ser humildes e se fechavam para agradecer-te pela dádiva que é a vida que a mim foi concedida. Invejo os momentos em que eu sabia orar quando medo meu coração sentia. E peco, por não ter coragem, por ter inveja-saudade minha, por continuar de mãos cruzadas. E peco, temo, tremo, choro... Corro feito criança perdida na areia molhada pelo mar que sou. Escrevo com a tinta dos meus pulsos nos cadernos e diários que inventei para gritar as minhas dores. O corpo cansado pede cuidados. E questiono-me acerca dos acúmulos materiais que todo homem ousa fazer. De que vale tudo? Por que não gastar seu dinheiro comendo algo que deseja muito, ou indo ver o filme que quer muito, se amanhã mesmo seus olhos poderão deixar de abertos estarem; se hoje mesmo seu coração pode cansar-se de ser artista e protagonista; se sua carne logo voltará ao seu estado primeiro: pó. ?

Eu quero mesmo seus cuidados de novo. Seu abraço apertado. Uma canção para brindar o amor. Um sorvete gelado. Andar de meias. Distraída. Andar de mãos dadas com as suas mãos. Se não for pedir demasiadamente, quero sóis coloridos, sorvetes de pistache. Quero o amor, meu bem querer enraizada(o) bem aqui no peito meu. E que todas as noites de estrelas muitas ao lado do amor, meu bem querer me seja cada vez mais felicidade. Desejo, outrossim, que a pureza, doçura e simplicidade desse amor, seja considerado pelo Senhor mais uma conjugação do verbo amar, que por vezes, assim sendo 'irregular' é mal vista aos olhos dos imorais. Eu quero amar entre iguais, sem classificação, sem excomungação. Quero de novo os teus olhos serenos ó Deus, sem medo de desaprovação. Eu quero que esta carta alce vôos... Amém!

5 comentários:

Anderson Meireles disse...

Amém!
É essa saudade sua, somada a dEle que fazem de nós, seres à sua imagem e semelhança...
Ele está guardado entre dois olhares verdadeiros...
Sejam de 'iguais', sejam de 'normais', se é que existem normais.
Esse texto é tudo o que existe de mais normal e Divino.
É a prova de que Deus fala com o homem.
Abraço!
PS: Sei que não gosta, desculpe pelo tamanho do comentário,rs.

Poeta Mauro Rocha disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Poeta Mauro Rocha disse...

Esse texto lembrou-me uma música do Raul Seixas "Gita"
e que começa assim:


"Eu que já andei
Pelos quatro cantos do mundo
Procurando
Foi justamente num sonho
Que Ele me falou"

"Às vezes você me pergunta
Por que é que eu sou tão calado
Não falo de amor quase nada
Nem fico sorrindo ao teu lado...

Você pensa em mim toda hora
Me come, me cospe, me deixa
Talvez você não entenda
Mas hoje eu vou lhe mostrar..."

BJS

Unknown disse...

Você tá cada vez melhor, maior... suas palavras são preces...parabéns!!!

Alecrim disse...

Certos Textos tem momentos pra ser lido. E hje era o dia. Naaa,vai saber porque. [Lane pensando] Quase fui a guria do texto/oração. Tem um pedaço.. sabe aqueles que qd a gente lê dá um frio na barriga?
"Escrevo com a tinta dos meus pulsos nos cadernos e diários que inventei para gritar as minhas dores." Esse.
É um texto que vem apertando as veias.. repuxando a pele.. sugando o ar. Liga não.. Adorei Dry.. Qd me recompor o lerei de novo, sem dúvidas..

Mil Beijos!